31 outubro, 2017

SAPIENS - História Breve da Humanidade - Yuval Noah Harari

Três importantes revoluções moldaram o curso da história: a Revolução Cognitiva deu-lhe início há cerca de 70 000 anos. A Revolução Agrícola acelerou-a há cerca de 12 000 anos. E a Revolução Industrial, iniciada há apenas 500 anos, pode muito bem pôr fim à história e dar início a algo diferente. Este livro conta como estas três revoluções afetaram os seres humanos e os restantes organismos.
“A superfície do nosso planeta mede cerca de 510 000 milhões de quilómetros quadrados, dos quais 155 são terra. Mesmo em 1400 d.C., a grande maioria dos agricultores, juntamente com as suas plantas e animais, aglomerava-se numa área de apenas 11 milhões de quilómetros quadrados: dois por cento da área do planeta. A restante superfície era demasiado fria, demasiado quente, demasiado seca, demasiado húmida ou, por qualquer razão, inadequada ao cultivo. Estes minúsculos dois por cento da superfície terrestre constituíram o palco onde se desenrolou a história da humanidade.”

É assim, numa linguagem cativante, acessível a todos, que Noah Harari expõe a sua perspectiva original e inteligente sobre a evolução humana. Aqui e ali, a inclusão de mapas, fotos, esquemas e desenhos, torna a leitura mais  informativa e apaixonante.

"Há 70 000 anos, o Homo Sapiens ainda era uma animal insignificante que fazia a sua vida num canto de África. Nos milénios que se seguiram, transformou-se no senhor do mundo inteiro e num dos flagelos do ecossistema. Hoje, está prestes a tornar-se num deus, preparado para adquirir são só a juventude eterna como também as capacidades divinas da criação e da destruição. (…)
Avançámos das canoas para as caravelas, para barcos a vapor, para vaivéns espaciais - mas ninguém sabe para onde vamos. Estamos mais poderosos do que alguma vez estivemos, mas não fazemos ideia do que fazer com esse poder. Mas pior ainda é que os humanos parecem mais irresponsáveis do que nunca." 
Existirá algo mais perigoso do que deuses insatisfeitos e irresponsáveis que não sabem o que querem?

Esta História Breve da Humanidade, escrita por um competente historiador, investigador e professor de História do Mundo, na Universidade Hebraica de Jerusalém, surpreende, prende, ensina.
É um livro para aprender e aprender.
Quando se lê, entende e aprende, é muito gratificante!

Sempre que uma amiga especial nos aconselha determinado livro, não hesitemos… 
Obrigada!

SAPIENS” – Historia Breve da Humanidade, de Yuval Noah Harari
Tradução de Rita Carvalho e Guerra
ELSINORE,20/20 Editora, 2017
504 págs.

24 outubro, 2017

Poema de... José Régio


IMPROVISO CORRIGIDO
Se minto? Quantas vezes!
Mas em palavras. Não
Nos meus olhos castanhos portugueses,
Nestas linhas atávicas da mão…
Se minto?... Minto, pois!
Mas nas orais palavras que vos digo,
Não nas que entoo a sós comigo,
E em que enfim deixo de ser dois.
Não nas que entrego a músicas, miragens,
Alegorias, fábulas, mentiras,
Cadências, símbolos, imagens,
Ecos da minha e mil milhões de liras.
Se minto?... Minto! É regra de viver.
Mas não quando, poeta, me desnudo,
E a mim me visto de inocência, e a tudo.
Venha quem saiba ver!
Venha quem saiba ler!



Retirei este poema do livro "Cântico negro", colectânea da poesia de José Régio.
O belíssimo poema com o mesmo nome foi postado no roldeleituras , em Maio de 2015.

José Régio, poeta português (1901-69)
Foto da net.

17 outubro, 2017

Quando se trata de pedir favores a familiares...


Quando se trata de pedir favores a familiares sou tomado de um pudor paralisante. A família é uma empresa complicada de hierarquias confusas, obediências, silêncios, recriminações. Esforço-me por manter as relações no plano da cortesia ou da intimidade mais intuída do que praticada. No fundo, gosto de estar em família por períodos breves. Estas aproximações – para esclarecer uma dúvida, pedir um carro para as mudanças ou uma toalha de mesa para o Natal – causam-me um certo desconforto. Prefiro deixar a família a pairar com a sua autoridade tácita, lá bem no alto, onde pouco interfere com o meu quotidiano. Cada qual na sua casa segundo os seus ritmos: isso é que está certo.”


Bruno Vieira Amaral, escritor português (1978-), in “Hoje estarás comigo no paraíso”, Ed. Quetzal, 2017
Foto da net.

13 outubro, 2017

"Nação crioula" - José Eduardo Agualusa

A vida de um escravo é uma casa com muitas janelas e nenhuma porta. A vida de um homem livre é uma casa com muitas portas e nenhuma janela.
Finalmente li José Eduardo Agualusa!
E comecei bem, “Nação crioula” (1997) é um romance inteligente, comovente, e bem escrito.
Conta, com humor e sensibilidade, a intensa, secreta (divulgar é sempre profanar) e atribulada história de amor de Carlos Fradique Mendes (aventureiro português) e Ana Olímpia Vaz de Caminha (jovem angolana nascida escrava, viúva do abastado Victorino Vaz de Caminha, bela, inteligente, rica, poderosa e respeitada), ao mesmo tempo que aborda temáticas sérias: Portugal nos finais do século XIX; a sociedade colonial angolana e brasileira; o tráfico negreiro; o movimento abolicionista.
O autor foi buscar o protagonista ao livro de Eça de Queirós ”Correspondência de Fradique Mendes” (1900), uma compilação de cartas trocadas entre Eça e o amigo-ficcionado Fradique.
“Nação crioula” também é um entrelaçado de cartas. Vinte e seis. Poucas recebidas por Fradique Mendes, muitas enviadas por ele para madame de Jouarre (a madrinha); Ana Olímpia (a amada); José Maria (o amigo Eça). Cartas escritas entre 1868 e 1900, Luanda, Lisboa, Rio de Janeiro e Paris.
A primeira, de Maio de 1868, começa assim:
"Minha querida madrinha,
Desembarquei ontem em Luanda às costas de dois marinheiros cabindanos. Atirado para a praia, molhado e humilhado, logo ali me assaltou um sentimento inquietante de que havia deixado para trás o próprio mundo…"
Nos anos seguintes, Fradique Mendes diverte-se, trata de negócios, viaja, "namora" a mulher amada. 
Em outubro de 1876, Ana Olímpia é de novo escrava, propriedade de familiares do marido falecido. Depois de muitas peripécias Fradique consegue libertá-la e foge com ela para o Brasil no “Nação Crioula” (...) provavelmente o último navio negreiro da História.
Em Junho de 1877 Fradique Mendes escreve a Eça e Queirós:
"Meu querido José Maria?
Estou agora no Rio de Janeiro, e embarco segunda-feira para Lisboa, onde tenciono permanecer um mês ou dois antes de seguir para Paris e depois para Londres. Os motivos desta minha peregrinação, sendo os óbvios (tenho negócios a tratar e amigos a rever), são também outros e menos públicos: liguei-me recentemente a uma sociedade secreta, antiescravista (chamamos-lhe a Sociedade do Cupim!), e parto com o objectivo de recolher apoios para esta causa entre os governos e instituições da velha Europa…"
Em Outubro de 1878, comunica à madrinha que é pai:
"Quem lhe escreve esta carta não é mais o ocioso e irresponsável aventureiro que V. viu crescer, vestindo-se nos melhores alfaiates de Paris para ocultar a miserável nudez da alma, sentindo o mundo com sentimentos alheios, e cujo único projecto de vida era, simplesmente, deixar-se viver. Sou outro! Sou, desde há dois meses, pai de uma belíssima menina…"
Fradique Mendes morre em Paris, no inverno de 1988. Em Outubro ainda escreve ao amigo José Maria (penúltima carta do livro):
"O que é que nós colonizámos? O Brasil, dir-me-ás tu. Nem isso. Colonizámos o Brasil com os escravos que fomos buscar a África. Fizemos filhos com eles, e depois o Brasil colonizou-se a si próprio. Ao longo de quatro demorados séculos construímos um império, vastíssimo, é certo, mas infelizmente imaginário…"
A vigésima-sexta carta, de Agosto de 1900, é de Ana Olímpia para Eça de Queirós. É uma carta de desabafo que acompanha a correspondência de Fradique Mendes pedida pelo escritor para publicação em livro, “uma forma de homenagear o português mais interessante do século XIX”. Nesse mesmo ano, o livro chega (mesmo) às livrarias…

Se quer saber mais sobre os dois livros… vai ter de os ler. Este, recomendo-o aos que gostam de romance, aventura, histórias do quotidiano colonial português (o de Luanda é tragicamente hilariante), História.
Eu vou continuar a ler Agualusa. Isso é ponto assente.
Despeço-me, que se faz tarde…

Nação Crioula, de José Eduardo Agualusa
Ed. Quetzal, 2017
165 págs.

10 outubro, 2017

Kazuo Ishiguro - Prémio Nobel da Literatura, 2017


Finalmente, a Academia Sueca acertou na atribuição do Nobel da Literatura ao premiar este ano um verdadeiro escritor, no caso, um romancista brilhante.
Isto porque nos últimos anos a “coisa” não tem sido famosa…
Kazuo Ihiguro, nascido em Nagasáqui em 1954 e a viver em Inglaterra desde 1960, é merecedor do prémio, sem quaisquer dúvidas.
A sua obra, não sendo vasta é poderosa: romances; contos; guiões para televisão; letras para canções.
Foco-me nos romances, sete, todos editados em Portugal:
- “As colinas de Nagasáqui”, 1982.
- “Um artista do mundo transitório”, 1986.
- “Os despojos do dia”, 1989 (adaptado ao cinema em 1993, por James Ivory). 
- “Os inconsolados”, 1995. 
- “Quando éramos órfãos”, 2000. 
- “Nunca me deixes”, 2005 (adaptado ao cinema em 2010, por Mark Romanek).
- “O gigante enterrado”, 2015
Dos sete romances eu já li quatro.
Desses quatro postei dois.
Então, se quiser postá-los a todos vou ter de reler dois, e ler três.
Contabilidade feita, vou “correr” as livrarias à procura dos romances que me faltam, antes que esgotem. Habitual após a atribuição do Nobel.
Pensando melhor, vou deixar a poeira assentar… nos próximos meses as livrarias vão abarrotar de livros do músico rejeitado na adolescência pelas editoras, agora romancista galardoado com o prémio maior da Literatura. Merecido!
As vossas vidas estão traçadas, escreveu Kazuo no romance “Nunca me deixes”. A vida dele estava, oh se estava!
Recomendo a todos que leiam Kazuo Ishiguro, um assombroso contador de histórias estranhas, sensíveis, belíssimas.

Eu, uma vez mais “chorei baba e ranho” (brincadeirinha!!) por não ver premiado o meu escritor preferido: Philip Roth.
Roth, repito o pedido do ano passado: não morras, please!

03 outubro, 2017

Para uma amiga especial...



Não importa se a estação do ano muda...
Se o século vira, se o milénio é outro.
Se a idade aumenta...

Conserva a vontade de viver,
Não se chega a parte alguma sem ela.


(Versos de Fernando Pessoa)

Foto da net